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Inovação em Massa ou Transformação Digital de Palco?

Este artigo é uma tradução adaptada do original escrito por Saul Kaplan (“So Many Corporate Innovation Labs, So Little Innovation). Os comentários ao final são de autoria de André Fernandes, CTO da Vertigo Tecnologia.

Todos já decoraram o mantra: “inovar para sobreviver”. Em um mundo em rápida transformação é imperativo ser capaz de se reinventar completamente em tempo cada vez mais curto. CEOs já entendem que a habilidade para inovar não é um diferencial competitivo, mas uma condição básica para a relevância (e existência) de uma organização.

É a farra da inovação.

Não está dando certo.

Os exemplos disruptivos do Uber, Airbnb e Netflix já foram usados à exaustão, quem carecia de catequese já foi atendido repetidas vezes. Vamos “jogar na ofensiva”, “criar mercados” e “pensar fora da caixa”.

A modinha da vez são os laboratórios de inovação corporativos, que se proliferam geometricamente pelas organizações ao redor do mundo. Quem não fica bem dizendo que tem um? Nenhum CEO quer passar vergonha no próximo evento do Gartner!

Fadados que estão a se submeterem ao processo decisório vigente nestas organizações, na melhor das hipóteses estes laboratórios irão produzir acessórios tímidos ao modelo de negócios atual ou provas de conceito que serão tão aplaudidas quanto ignoradas logo a seguir.

Após toneladas de confete e incontáveis tapinhas nas costas dos CEOs que os inauguraram com habitual cerimônia e fanfarra, a retórica impecável sobre como laboratórios trazem as virtudes da disrupção e criatividade terá como resultado prático apenas isto: fotos do CEO e seus papagaios de pirata na intranet ou mídia tradicional.

Isto não deveria surpreender ninguém: laboratórios de inovação são concebidos, estruturados, abastecidos e orientados a produzir apenas incrementos aos negócios correntes. Assim que os gestores e líderes das atuais unidades de negócios tomarem de assalto a agenda do laboratório de inovação ele estará condenado a apenas produzir mais do mesmo.

A inércia organizacional fará com que projetos do laboratório sejam priorizados e custeados para criar produtos, serviços ou melhorias marginais aos processos de negócios atuais. Isto não é necessariamente ruim: empresas saudáveis e competitivas devem se comportar assim. Porém iniciativas de inovação como estas não irão contribuir em nada para que estas organizações não sejam “engolidas” pelo próximo Netflix do seu setor.

Conclusão: laboratórios de inovação corporativos não estão sendo criados de forma a ajudar estas empresas a causar disrupção — nem tampouco reagir a ela. E eis os motivos…

10 Motivos pelos quais Laboratórios de Inovação Corporativos Terão Resultado Irrelevante

  • Os objetivos (e independência) dos laboratórios de inovação não são claros. Inovação incremental ou transformadora demandam abordagem e apoio organizacional bem distintos;

 

  • CEOs devem considerar a agenda transformadora como sua própria agenda. O que notamos, porém, é que mal saem os holofotes os CEOs cedem a autoridade a níveis de gestão inferiores cuja performance é medida pelo modelo de negócios atual;

 

  • Laboratórios de inovação caem no vício de sobrevalorizar a produção de “melhores ratoeiras”, em oposição a melhores modelos de negócios;

 

  • Inovações com potencial realmente relevante mas que provavelmente irão canibalizar o negócio atual são fustigadas e extirpadas da pauta corporativa, deturpando todo o propósito do laboratório;

 

  • Exigir projeções financeiras para projetos de inovação antes de experimentá-los no mundo real faz sentido (talvez) apenas para inovações incrementais, nunca para as realmente transformadoras (nota do tradutor: isto sequer é novidade, vale a pena lembrar o desastre do six-sigma para empresas outrora inovadoras, como em http://www.zdnet.com/article/six-sigma-killed-innovation-in-3m/);

 

  • Laboratórios de inovação corporativos tendem a enxergar novas tecnologias pelas lentes de seus modelos de negócios vigentes e não como catalisadores de modelos completamente novos;

 

  • Laboratórios de inovação corporativos costumam preservar a miopia organizacional que impede a organização de enxergar oportunidades do ponto de vista da experiência do cliente;

 

  • Fundos corporativos (corporate venture funds) para fomento de inovação não são laboratórios de inovação. Embora possam prover capital e recursos para empreendedores, costumam reter os ativos mais pertinentes: capacidade de escala e acesso aos seus mercados. Nota do tradutor: os processos decisórios que orientam estes fundos podem inclusive tornar toda a iniciativa um desastre completo, quando relações pessoais e vaidade — em contraste com resultados — são a meta destes projetos;

 

  • Laboratórios de inovação corporativos não costumam ser organizados com a liberdade necessária para criar sandboxes que desafiem processos vigentes e experimentem novas formas de criar, entregar e capturar valor;

 

  • Organizações carecem de gestão de talentos que desenvolvam novas lideranças com experiência de trabalho tanto nas competências centrais quanto no laboratório de inovação (nota do tradutor: não raro estes talentos em particular, questionadores por definição, são extirpados cedo em suas carreiras).

 

É claro que sempre devemos melhorar no que fazemos, dia após dia. Mas inovações incrementais (ou melhoria contínua, como preferir) não são suficientes — a vida seria mais simples se fossem. Há momentos — e vivemos em tempos assim — nos quais transformações são necessárias. Nó século XXI a habilidade mais vital — para indivíduos ou organizações — é a capacidade de se reinventar.

Ainda assim, transformação, reinvenção e disrupção não deveriam assustar ninguém. É possível criar condições para explorar e testar modelos de negócios completamente novos enquanto ainda “pedalamos” no negócio antigo.

Um importante papel do laboratório de inovação corporativo é, portanto, focar na pesquisa e desenvolvimento de novos modelos de negócios — analogamente ao que o negócio tradicional faz com o P&D de serviços, produtos e tecnologias para o negócio vigente. O desprendimento com o modelo de negócios atual e com a estrutura de poder e processo decisório que a suporta é imperativo para a busca por novos modelos de negócios. A estratégia corporativa de inovação deve, portanto, ter abordagens distintas para inovação incremental (que coaduna com o negócio atual) e inovação transformadora (disruptiva para o negócio atual).

Que os CEOs estejam levando inovação com seriedade é uma coisa positiva. Alguns devem estar percebendo que simplesmente inaugurar um laboratório como uma unidade de negócios comum subordinada aos gestores atuais não será efetivo — o que é real. À medida que CEOs percebam corretamente a inovação de modelos de negócios como uma necessidade recorrente em sua agenda estratégica, provavelmente veremos então abordagens à inovação mais eficazes — e menos panfletárias.

Por ora, contudo, isto é o que temos: muitos laboratórios de inovação corporativos, quase nenhuma inovação produzida.

 — — — —

Comentários do tradutor:

O que me motivou a traduzir o texto original foi minha constatação que o Brasil está bem no início desta febre, enquanto os EUA parecem estar atingindo um ponto de maturação. No presente momento não se passa um dia sem que instituições privadas e públicas anunciem suas Hamburguerias corporativas a moda Bel Pesce, com enorme espalhafato midiático e total ausência de propósito.

Quem conhece estas instituições por dentro sabe o quanto estas consideram sacrossantos seus processos e silos atuais e percebe, sem nenhuma dificuldade, que estas iniciativas são mais orientadas por vaidade e discursos vazios que pela real vontade de transformação.

Estas instituições privadas continuarão inertes ao avanço de negócios disruptivos, ou continuarão lutando a luta antiga de cultivo de barreiras de entrada (o que é ruim para todos).

Já as instituições públicas continuarão atendendo à sociedade com seus mesmos vícios e cegas ao papel que realmente deveriam cumprir. Se empresas privadas estabelecidas têm dificuldades para rever seus processos, organizações públicas têm pelos mesmos um apreço profundo que enche o coração de um burocrata de alegria. A luta é bem mais árdua…

Os laboratórios de inovação corporativos não podem ser uma reedição, com smoking, do empreendedorismo de palco. Mas o que observamos atualmente? Confete, fanfarra e…mais nada. Um laboratório de inovação que não tem liberdade para desafiar os processos vigentes, reinventar modelos de negócios e pisar em todos os calos corporativos não terá utilidade alguma. As pessoas que conhecem bem o negócio atual e ao mesmo tempo são capazes reinventá-lo com total desprendimento dos processos e estrutura organizacional atuais são o ativo mais precioso de uma organização — conte com elas.

No que diz respeito à TI corporativa, urge que esta torne-se um catalisador de mudanças. O discurso de transformação digital, que acompanha inequivocamente os laboratórios de inovação, preconiza a adoção de novos processos e tecnologias que permitam — que incentivem — a criação, teste e entrega de todos os produtos digitais que dêem suporte (e meçam resultados) à experimentação de novos modelos de negócios.

É um enorme contra-senso, portanto, escolher como parceiro para a transformação digital um vendor tradicional de TI. O débito tecnológico destas empresas é gigantesco — seria o mesmo que contratar um elefante para dar aulas de balé. O discurso de inovação e transformação digital já foi obviamente apropriado pelos nomes tradicionais de sempre, mas definitivamente não foram os grandes vendors tradicionais que deram escala à computação em nuvem, software open-source, DevOps ou aos modelos SaaS, PaaS, IaaS etc. Todas as inovações fundamentalmente transformadoras em TI nos últimos anos não vieram dos vendors tradicionais de TI (pelo contrário, foram combatidas pelos mesmos com unhas e dentes). É no mínimo estranho (senão quixotesco) conversar sobre transformação digital com um vendor que até ontem estava tentando empurrar um mainframe ou um middleware obsoleto.

Uma TI catalisadora de mudanças é um ativo fantástico para qualquer organização. Depois das pessoas desafiadoras que já mencionei, este é o segundo ativo mais precioso de uma organização. Para chegar lá é preciso escolher como parceiro quem sabe o que está fazendo – e manter distância de quem tem uma quota de lata ou middleware para vender no quartil.

Transformação digital de palco só fica bem na Intranet.

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